No final de semana do dia 6 de novembro de 2010, milhões de brasileiros perderam a saúde numa prova inútil: o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM).
São adolescentes que estudaram, permaneceram 5 horas trancados numa sala fazendo prova (sem poder sequer olhar no relógio pois seu uso era proibido!), e ao saírem descobriram que estava tudo errado e que a prova poderia ser anulada, o que de fato aconteceu por decisão judicial, no dia 8 de novembro.
Neste ano ocorreu um vazamento do tema da redação e uma série de erros da prova e do gabarito. No ano anterior uma prova clonada. Fiascos consecutivos. Claras mensagens de que todo o esforço sério dos estudantes deu num beco sem saída.
São incontáveis seres humanos, em fase de crescimento, desenvolvimento e formação de corpo e mente, que foram submetidos – como veremos – a uma das mais atrozes e prejudiciais formas de stress.
De um lado, sempre que um indivíduo é testado ou colocado à prova, isso representa uma situação de stress. Não é necessariamente algo ruim. Seja qualquer que for o teste, todos queremos passar! Por maior ou menor o grau do teste, é sempre um stress. É sempre um desafio. Em situações naturais, esse desafio resulta numa recompensa ou num estímulo para se aprimorar, evoluir. Um desequilíbrio (stress) que é seguido de evolução e reequilibro (feedback).
Isso acontece consciente ou inconscientemente, em qualquer fase da vida. Para o bebê que está aprendendo a falar, perceber dos pais que finalmente articulou a palavra que estava tentando, com dificuldade, balbuciar, é grande alegria. Para uma criança na escola, escrever a primeira palavra é grande desafio e fazê-lo corretamente é imensa glória. Na idade adulta, passar na entrevista do tão sonhado emprego é a recompensa de um desafio, de um esforço tão grande. Na velhice, há outros tantos desafios e recompensas.
Mas na adolescência, parece que todos os desafios são superlativos!
O resultado da prova, competição, campeonato, tudo parece ser de suprema importância. Uma verdadeira questão de vida ou morte! Na adolescência, a percepção do desafio é multiplicada.
Quanto mais um indivíduo percebe um desafio como difícil e importante, maior será a carga de stress conferida por esse desafio para aquele indivíduo. Para o adolescente na fase da vida em que deseja provar tudo a todos, esse stress é muito maior. Junte-se a isso a pressão de professores, pais, tios, avós, e a competição entre eles próprios… e aí nós temos uma BOMBA de stress.
Cabe à família e ao meio social cuidar para que essa bomba seja manuseada, administrada e finalmente desativada com carinho e cuidado, e no processo transformar esse adolescente num adulto competitivo, saudável, mentalmente estável, feliz, realizado. Cabe às escolas e ao governo não atrapalhar esse processo.
Assim, uma “bomba” de stress não é de todo ruim. O ser humano, desde que o mundo é mundo, passa por grandes situações de stress e isso pode derivar numa série de benefícios, tornando-o mais capaz, mais forte de espírito, mais apto.
Mas como em qualquer aspecto da vida, qualquer coisa em exagero faz mal.
Numa fase como a adolescência onde tudo é superlativo, se você apresenta para esse ser superlativo tudo em demasiado, o que acontece com esse ser superlativo?
Ao mesmo tempo os adolescentes também estão “testando” tudo. Ao se sentir estressados e cansados, uns poucos irão relaxar no parque, correndo e andando de bicicleta. Outros MUITOS, por conta da cultura e estilo de vida disfuncionais do nosso meio, irão “descontar” na comida (nada saudável), no cigarro, na bebida alcoólica com os amigos na balada, e pior ainda, nas drogas ilícitas. À eterna busca de uma resposta, de um ponto de apoio, passarão a apresentar abalos no seu humor, estado mental e personalidade. A maioria dos pais poderá confundir isso com “mudanças normais da adolescência”. Alguns pais, percebendo que algo definitivamente está errado, levarão seus filhos ao médico. Os médicos, com a melhor das intenções, passarão a receitar medicamentos antidepresivos, ansiolíticos, anti-hiperatividade, anti-isso e aquilo. Assim trocou-se seis por meia-dúzia. Assim, muitos adolescentes pelos 15 ou 16 anos já experimentaram cigarros, bebidas alcoólicas, ansiolíticos, antidepressivos e sabe-Deus-mais-o-que. É isso que você quer para seu filho?
Na vida, nós passamos por inúmeras provas. Quando você nasce, é uma prova! É preciso passar pela prova de nascer. Seu coração precisa bater direito, você precisa respirar direito, nascer direito. Na adolesência continuamos passando por provas. A aparência física se modifica e passa a ser cada vez mais importante na nossa cultura. Quando casamos, passamos por nova prova. Ao ter filhos, nova prova. Tantos desafios! Passar num teste de emprego é uma prova. Provas existem e fazem parte da vida.
Provas como o ENEM e vestibular poderia ser vistas como forma de treinamento para as provas da nossa vida profissional, pessoal etc. Mas não se ocorrerem dessa forma totalmente avacalhada, sem seriedade.
No dia marcado, o aluno que se preparou, vai lá, repleto de expectativa, faz a prova (uma verdadeira maratona) e de repente alguém diz que não valeu!?!
COMO NÃO VALEU??
Nada no mundo vai compensar o stress daquela prova que não valeu! O NÃO VALEU vira um motivo de stress da pior especie. Não houve recompensa nem feedback nem solução. Simplesmente não valeu. Ficou no ar. Todo aquele esforço e expectativa não teve significado nenhum. Isso pode desestabilizar a saúde mental e física de muitos adolescentes!
Quando você faz uma prova, subentende-se um resultado. Seja ele bom ou ruim, você teve um resultado. Teve uma resposta. Não falou com as paredes. Você já tentou conversar com seu marido enquanto ele assistia um jogo de futebol? Não teve vontade de jogá-lo pela janela quando você falou, falou e falou, e ele simplesmente não registrou uma única palavra? Ou já tentou falar cofm sua esposa e ela, tão vidrada na novela, simplesmente ignorou sua presença? Pois bem, na prova falida do ENEM esse tipo de frustração, sensação de tempo perdido, raiva, tristeza e pensamentos negativos são elevados exponencialmente! O indivíduo se esforçou, quis passar uma mensagem à família, ao governo e à sociedade – mas na verdade não havia ninguém para responder à sua mensagem. Simplesmente NÃO VALEU. A sensação disso e a consequencia para o organismo e para a vida é muito pior do que se imagina. Por causa de uma neurose social, a maioria das pessoas vêem provas como o ENEM e o vestibular como uma questão de vida ou morte.
A ilusão prevalecente – e quanta ilusão! – é que se um indivíduo não “passa” no ENEM ou vestibular, então ele é um MENOS, um zé-ninguém, um zero-à-esquerda, uma vergonha para a sociedade, não vai ser ninguém na vida. Infelizmente não há como colocar na cabeça desses iludidos que ENEM e vestibular não são passaportes para o sucesso ou a felicidade, muito menos para uma vida bem vivida e realizada. Tais indivíduos não poderão jamais compreender que a felicidade, realização profissional e riqueza derivam da individualidade, criatividade, pensamento livre, capacidade de relacionamento, confiabilidade, valores éticos – e acima de tudo, apaixonar-se pelo seu trabalho ou estudo. E nada disso se conquista através do ENEM ou da faculdade. Pelo contrário, se perde na maioria das vezes.
Minha opinião
Se algum tema te apaixona, – não importa a sua idade – leia sobre ele. Busque as raízes, as origens desse tópico. Aprofunde-se. Logo verá que todas as áreas do conhecimento humano estão interligadas. O seu conhecimento geral evoluirá e florescerá no delicioso processo natural de fornecer subsídio ao seu tema favorito. Converse com as pessoas, conheça gente, faça – e mantenha – amizades, mas escolha bem seus amigos. Confie e seja confiável. Pratique esportes. Ouça música. Cante sempre que puder. Nunca se esqueça de brincar, ser um pouco criança. Nunca perca a alegria. Sorria muito. Desenvolva seu senso de humor. Observe as maravilhas à sua volta. Tenha fé. Permita-se sonhar alto e ir em busca da realização de seus sonhos. E se, durante esse processo, deparar com a necessidade de cursar uma faculdade, não se preocupe: seu conhecimento, cultura, estabilidade física e emocional te colocarão no topo da lista de aprovados no vestibular. Enquanto estiver na faculdade, não perca de vista seus sonhos. Isso não será fácil, pois uma das maiores façanhas das faculdades do Brasil é desiludir, destruir sonhos, nivelar por baixo e mergulhar os alunos num poço – pior: num lamaçal movediço – de mediocridade. São seus estudos, passeios, aquisição de cultura e erudição fora da faculdade que poderão te manter em foco durante este período acadêmico de vários anos. Ao final, você certamente estará mais competente, apto, interessante para o mercado, que a massa de desiludidos massacrados por ENEMs e neuróticos por vestibulares, que fumam e/ou bebem em demasia, vivem de modo superficial, cuidam mal da mente e do corpo e consequentemente são assolados por desconfortos físicos e emocionais. Você estará mais próximo do sucesso pessoal, familiar e profissional. Mais ainda, poderá contribuir, com seu exemplo e energia, para uma sociedade cada vez melhor.
Fonte
Dr Alexandre Feldman
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Excelente artigo do Dr. Feldman!!! E realmente faria muito bem ser dado atenção enquanto somos mais novos, a vida ficaria bem mais leve e sobretudo seríamos mais felizes!
"...felicidade, realização profissional e riqueza derivam da individualidade, criatividade, pensamento livre, capacidade de relacionamento, confiabilidade, valores éticos – e acima de tudo, apaixonar-se pelo seu trabalho ou estudo. E nada disso se conquista através do ENEM ou da faculdade. Pelo contrário, se perde na maioria das vezes."
Lena Rodriguez
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