Desconhecemos a autoria. Mas trata-se de
um texto suprido de muito realismo e que toca a cada um de nós. Longo,
porém, lúcido e desprovido de qualquer falsidade. Remete-nos a uma
leitura, se não fascinante, pelo menos muito meditativa. O ser, pelo
ter, de nossa era, é realmente preocupante.
“Troque de carro; troque de televisor;
troque de celular; mude para nossa operadora, pois temos os melhores
planos; beba mais cerveja; etc.etc.etc. Assim está sendo 24 horas por
dia, por sete dias da semana. Não estranhem se amanhã, na abertura do
telejornal, anunciarem o velório da coerência, pois vivemos a Era da
Insensatez. Consumo, logo existo. Na sociedade consumista, quem não
consome não existe.
William Bonner equiparou o telespectador
nacional a Homer Simpson, um sujeito preguiçoso, burro, que adora ficar
no sofá, assistindo TV, comendo rosquinhas e bebendo cerveja, e que só
dá mancadas na vida.
O mais preocupante, porém, não é o fato
de termos como editor chefe e apresentador do maior jornal televisivo do
país alguém que nivela milhões de telespectadores com Homer Simpson.
Devemos perguntar: “e se Bonner tiver razão”? Como foi que conseguimos
alcançar tal condição? A quem interessa que continuemos assim? A
televisão amolece o corpo e o espírito.
No Brasil, segundo o IBOPE, as pessoas
vêem, em média, cinco horas de TV por dia. O sonho dos diretores
televisivos é ter como audiência uma imensa massa crítica sem uma real
capacidade de análise. Um público que não pensa, não questiona,
facilmente manipulado, que compra tudo o que lhe mandam comprar.
Consuma. Beba. Exista. Saia da rotina do dia-a-dia.
E o que dizer do “dumingão” do Faustão.
Das vídeo-cassetadas para disfarçar? Segundo Millor Fernandes, uma série
de estudos demonstrou que, no Brasil, os jovens bebem cada vez mais e
cada vez mais cedo. É simplesmente rizível imaginar que eles teriam mais
cautelas apenas ouvindo aquela rápida frase que alerta (beba com
moderação) depois do sensualissimo anúncio com mulheres estupendas.
Embriague-se com moderação.
E o que dizer do Pedro Bial, quando se
dirige aos participantes do BBB, chamando-os de “nossos heróis” e
“nossos mártires”. (Ele não sabe nem o que é ser herói, muito menos o
que é ser mártir). Quão deturpados estão os conceitos de heroísmo e
martírio. A que ponto chegamos. Vejamos, porém.
Escola Pública no sertão pernambucano.
Sem acabamento nas paredes. Há um ano sem merenda escolar. Banheiros
interditados. Não seria mais sensato qualificar de heróis e mártires
nossos professores. Eles que quase sem nenhum reconhecimento e em
condições tão adversas, tentam manter acesa a chama do saber e do
conhecimento. Heróis e heroínas são, também, os pequeninos alunos e
alunas com seus chinelos gastos, muitas vezes, obrigados a percorrer
longas distâncias a pé para chegar à sala de aula.
Bial e toda a produção do BBB deveriam
assistir ao documentário “Pro Dia Nascer Feliz”, do diretor João Jardim,
que aborda a situação da (vergonhosa) educação no Brasil. Quem sabe, o
próximo “reality show” possa mostrar a dura realidade da grande maioria
dos professores e alunos da rede pública, seja no sertão nordestino,
seja nas periferias de qualquer capital.
E o que dizer das festas promovidas
pela produção do Big Brother Brasil? Que belo exemplo para nossos
jovens. Enquanto professores e escolas se esforçam para formar cidadãos,
a televisão fabrica consumidores.
Outubro é o mês das crianças. O valor
gasto no Brasil em publicidade dirigida ao público infantil chega a
aproximadamente 200 milhões de reais.. No mesmo período o programa
federal de desenvolvimento da educação (FNDE) não chega a 30 milhões de
reais.
A televisão transforma crianças de tenra
idade em consumidores e, por isso mesmo, segundo especialistas em
comportamento infantil, têm constatado mudanças significativas
provocadas pela exposição massiva e precoce à publicidade. Diante da TV o
telespectador está fisicamente inativo. Dos seus sentidos, trabalham
apenas a visão e a audição. Mas de maneira parcial. Os olhos
praticamente não se mexem. Os pensamentos estão inativos. Não há tempo
para o raciocínio consciente e para fazer associações mentais, já que a
atividade cognitiva está muito lenta. Enfim, o cenário é semelhante a
uma sessão de hipnose.
Na leitura é preciso produzir uma
intensa atividade interior. Num romance é preciso imaginar o ambiente e
os personagens. Num texto filosófico, ou científico, é preciso associar
constantemente os conceitos descritos. Na TV, pelo contrário, não se
exige qualquer atividade mental. A idéia chega pronta, acabada. Não há
nada para associar.
Infelizmente, a televisão vem ocupando
um crescente papel na transmissão dos caminhos da infância. As emissoras
e os anunciantes assumiram tal incumbência pensando no lucro imediato e
não nas crianças ou no futuro da nação”.
Compre. Beba. Consuma. Anúncios,
anúncios e mais anúncios. Possua. Consuma. Troque. Compre. Será que
estamos mesmo no caminho de nos tornarmos órfãos do conhecimento? Da
sabedoria? Estamos trocando, mesmo, o ser pelo ter? A lógica de
Descartes nos diz “penso, logo existo”. A lógica do consumismo é:
“consumo, logo existo”. Enfim, a televisão manipula, mesmo, o
telespectador a seu bel prazer?
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